"A escada para o Reino dos Céus está escondida em tua alma. Mergulha para dentro dos pecados que estão em ti mesmo e, assim, encontrarás ali uma escada pela qual poderás ascender" Isaac de Nínive.
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Obs.: Abaixo, tradução do versículo bíblico para outras línguas:

"POR ISSO A ATRAIREI, CONDUZI-LA-EI AO DESERTO E FALAR-LHE-EI AO CORAÇÃO" Oséias 2,16
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domingo, 20 de novembro de 2016

Dom abade Meinrad Josef Schröger, O.Cist






Era janeiro de 1994, meu primeiro contato com o Mosteiro de Jequitibá, depois de horas e horas de viagem com alguns minutos de parada em Ipirá, no intuito de rever um antigo amigo de seminário do Pe. Raymundo Peretti Guimarães e sob sua companhia que chegamos ao nosso lugar de destino.

Uma só coisa desejava... compreender a vontade de Deus a meu respeito naquele delicado e específico momento de minha vida, tornar claro o apelo interior que de dia e de noite me intercalava sobre o devir, e, assim, como em épocas remotas de nossa era cristã – ainda que sob contexto diferente – atravessei uma parte do sertão, pequena parcela do nordeste, e fui estar no Morro da Graça, onde se situa hoje o Mosteiro dedicado a Mãe de Deus com o título de Divina Pastora.   

Tudo era tão encantador e novo para mim. Após sermos acolhidos e levados para o lugar (cela) conjunto de nossa permanência fomos apresentados em seguida ao Superior naquele momento, o abade Antônio Moser de saudosa memória, que nos deu as boas vindas. 

O silêncio era a morada do lugar... só se ouviam os cantos dos pássaros e as rajadas de vento que faziam tremular as palmeiras, não se via até ali ninguém, estava curioso em conhecer os monges, mas não se via nenhum até então com exceção de alguns vaqueiros que eram funcionários do mosteiro, que cooperavam com os mesmos na fazenda onde os monges eram os administradores. 

Chegamos pouco antes do final da tarde, seguramente os trabalhos naquele dia quente já haviam findados e cada um se preparava para os ofícios subsequentes. Entre as pequenas descobertas do lugar e encantamento se ouve naquele instante o ecoar dos sinos e portas que se abriam e fechavam sob passos firmes que se ouvia até despontar um, dois, três, quatro, cinco e mais monges que se dirigiam à capela para a oração vespertina. Todos silenciosos, recolhidos que saudavam de forma singular a mim e ao padre visitantes com uma suave inclinação da cabeça como se dissesse: bom dia, boa tarde ou até mesmo bem vindos! 

Tudo era encantamento para mim. Seguindo à capela os via todos posicionados, alguns mais novos levantando e abrindo uns livros imensos para a oração daquele instante, e, voltados ao tabernáculo quando ao sinal do relógio, 17h45min ouvi a entoação: + Deus in adjuntórium meum inténde...

Apesar de não entender bem o que significava a melodia era espetacular. Passei a me debruçar sobre o significado daquelas primeiras palavras cantadas em latim Deus in adjutórium meum inténde... Tudo era perfeito.

Embora já tivesse conhecimento da vida monástica em visita muitas vezes ao Mosteiro Nossa Senhora da Vitória em São Cristóvão/SE, de monjas beneditinas, era a minha primeira experiência com monges e cantando em latim, foi fantástico. Após a introdução tudo seguiu naquele momento sob muita atenção de minha parte que embora não compreendesse nada a melodia me fazia rezar muito mais.

Ao término fui apresentado pelo irmão hospedeiro, não me recordo mais o seu nome, ao mestre de noviços, na época Pe. Meinrad Schröger que, me dando também as boas vindas, marcou a primeira conversa para o dia seguinte. 

Um misto de simplicidade e ternura marcou aquele contato, rápido, mas que ficaria gravado para sempre em minhas lembranças, no meu coração. 

Ao mesmo tempo em que se mostrava severo, no que concerniam as exigências da comunidade local naquele período se mostrou também ‘sempre aberto para a escuta’ da qual, como um filho de São Bento, lhe é peculiar. Esta conversa me fez pensar... naquela ocasião não havia concluído ainda o segundo grau. Já decidido, deveria retornar para a minha cidade natal e assim poder continuar e concluir os estudos voltando definitivamente para o Mosteiro.

Até aqui, fiz questão de escrever esta breve memória de minha caminhada e discernimento não sem importância para o que pretendo narrar em seguida, mas como complementação da mesma. 

Foi no ano de 1995 que entrei em Jequitibá, o mosteiro estava passando por transição uma vez que o abade anterior Antônio Moser – que esteve a frente do Mosteiro por 50 anos – estava deixando o cargo para um novo eleito. A comunidade em capítulo havia deliberado por Pe. Meinrad que assumindo o abaciado no ano seguinte adotou o lema: “MISERICORDIA ET COPIAE” (Misericórdia e partilha) que regeria sua trajetória de pastor daquele pequeno rebanho por oito anos.

Os caminhos são diversos. Entre acertos e erros nos é permitido trilhar livremente até nos descobrirmos a nós mesmos, e, a partir daí, na originalidade que deve ser cada pessoa – segundo o Espírito – fazer a vontade de Deus. 

Não tenho dúvida alguma que a paternidade espiritual do Dom abade Meinrad soube ser precisa, sobretudo no que diz respeito aos conflitos particulares e comuns vividos mim e consequentemente por cada pessoa. Suas palavras e exortações na Regra, na Santa Eucaristia, nos diálogos comunitários bem como particular, foram direção acertada de uma paternidade que não se compreende a partir de laços conaturais, mas sobrenatural, que vem do alto e faz-se ato no coração aberto e dócil. 

Eu vi, o que de fato escrevera como lema de vida, ser praticado no seio da comunidade quer interna como externa. A meu ver, não poderia ser diferente para alguém que sabe de fato dar ouvidos a história particular de cada um como soube Dom abade Meinrad. Ao dar ouvidos, jamais deixou de levar em consideração os fatos peculiares de cada história em suas decisões. Interessante observar que, só se transmite exteriormente – em se tratando da comunidade local vizinha – aquilo que se faz em sua comunidade particular (religiosa); não dá para ser um num lugar e ser diferente num outro, assim foi a vida abnegada, doada, sacrificada pela ‘sua gente’ no Brasil, ao transmitir vida para uma comunidade interira através do saber com a criação da escola rural na Estação Jequitibá.

Como testemunha que fui, ele soube dar a cada um segundo a necessidade, soube repartir os bens e transmitiu muito amor. Tanto adora o Coração de Cristo, tanto pensa em Seu amor, no silêncio, nas meditações e no recolhimento de sua cela que se tornou semelhante a Ele.


Por ocasião do término do Ano da Misericórdia

Solenidade de Cristo Rei do Universo, 2016.






Um comentário:

  1. Muito interessante e edificante este relato. O reconhecimento grato das pessoas que nos marcaram na vida é coisa rara hoje em dia.

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